RECOMENDAÇÕES DE ARROLHAMENTO

Informação gentilmente cedida e partilhada pela APCOR.

O engarrafamento, transporte e armazenagem dos vinhos são etapas cruciais na vida do vinho, pelo que devem ser observadas algumas regras básicas para tirar o máximo partido das propriedades das rolhas de cortiça, a saber:

Na selecção das rolhas apropriadas às garrafas usadas e ao tipo de vinho a engarrafar;

Na correcta armazenagem das rolhas de cortiça antes do engarrafamento;

No engarrafamento (com especial atenção para o uso correcto das rolhas na linha de enchimento, especialmente no respeito das condições adequadas no jogo de maxilas), transporte e armazenagem do vinho.

A observação destas regras é decisiva para assegurar a qualidade no momento do consumo do vinho.

As rolhas a usar devem ser escolhidas tendo em atenção a máquina de engarrafar, o tipo de garrafa e a dimensão do gargalo, assim como o tipo de vinho a engarrafar e o circuito previsto para o vinho no mercado (transporte e tempo de rotação).

Para a generalidade dos vinhos, e não deixando de atender ao perfil interno do gargalo, o diâmetro da rolha natural deve ser pelo menos 6 mm maior que o diâmetro menor do gargalo.

Para estágios em garrafa muito prolongados, aconselha-se um diâmetro superior a 6mm, não devendo exceder os 8mm.

Caso se trate de rolhas técnicas ou aglomeradas, dada a sua maior densidade, na selecção de diâmetro deve optar-se por cerca de 1mm a menos.

A rolha poderá ser tanto mais longa e maior em diâmetro quanto maior o tempo de estágio em garrafa programado para o vinho. No entanto, em relação ao comprimento da rolha, deveremos respeitar sempre o necessário espaço entre o seu topo inferior e a superfície do vinho (cerca de, no mínimo, 15mm) de forma a guardar uma câmara de expansão que compense eventuais expansões do vinho por efeitos térmicos.

Para vinhos com algum gás (pressão interna acima do normal), devem-se escolher rolhas com um diâmetro superior ao recomendado para vinhos tranquilos. Em geral, e como exemplo, para vinhos com cerca de 1 bar de pressão interna, recomenda-se um diâmetro de 8mm maior que o menor diâmetro interno do gargalo (Figura 1).

Sempre que possível, as rolhas de cortiça devem ser utilizadas logo após serem recebidas. Devem evitar-se os longos períodos de armazenamento. O período máximo aconselhável é de até 6 meses, em condições de armazenagem apropriadas.

Abrir as embalagens de rolhas só quando chegar o momento de as utilizar. Em geral, as rolhas são embaladas em sacos que contêm SO2. Este gás age simultaneamente como um anti-séptico e antioxidante, protegendo as rolhas.

Rolhas não usadas devem voltar a ser embaladas em sacos com SO2 (entre 0,5g e 4 g de SO2 por saco de 1000 rolhas).

A armazenagem das rolhas deve ser efectuada:

Em locais frescos e secos com uma temperatura estável entre os 15 ºC (59F) e os 20 ºC (68F) e uma humidade relativa entre os 50% a 70% (Figura 2);

Em locais livres de odores e afastados de bolores, todo o tipo de combustíveis, e de produtos que contenham químicos como, por exemplo, produtos de limpeza ou tintas;

Em locais em que não existam madeiras tratadas com produtos clorados (como por exemplo nas estruturas dos tectos recém construídos, ou em paletes de transporte).

A observação de todas estas recomendações é essencial para que, na altura do engarrafamento, as rolhas continuem a ter as mesmas  características físicas e químicas e estejam isentas de qualquer tipo de contaminação exterior.

Valendo-se da compressibilidade da cortiça, a rolhadora comprime a rolha para ser possível a sua introdução no gargalo da garrafa.

Uma compressão adequada é aquela que é feita a um valor 2mm inferior ao diâmetro do gargalo na sua embocadura e evitando compressões da rolha superiores a deformações do diâmetro superiores a 33%. Assim, uma rolha de 24mm de diâmetro não deve ser comprimida para um diâmetro menor do que 15,5 mm para entrar num gargalo de 18,5mm de diâmetro (Figura 3).

Nunca se deve fazer uma compressão superior a 33% do diâmetro da rolha, pois existe o risco de se comprometer a sua elasticidade, com perda de parte da memória e, consequentemente, dificultando a correcta vedação do vinho na garrafa. Assim, para uma rolha de 24mm de diâmetro, a compressão recomendável é de cerca de 8mm (o que equivale aos cerca de 16,5mm anteriormente referidos).

Valendo-se da sua elasticidade, a rolha recupera o seu volume nos primeiros 5 a 10 minutos que se seguem ao arrolhamento adaptando-se a todas as irregularidades do gargalo; no entanto apenas cerca de 1 hora mais tarde é exercida uma força uniforme ao longo de toda a superfície do vidro. Para isto, é aconselhável não colocar a garrafa na horizontal, logo depois de ter sido arrolhada (Figura 4).

No caso das linhas de engarrafamento em que após o arrolhamento se procede de imediato ao acondicionamento horizontal das garrafas nas suas caixas, é possível minorar os riscos, prolongando o tempo de permanência da garrafa no tapete de circulação que vai da máquina de rolhar à máquina de etiquetar. Para isso, bastará acrescentar mais secções de tapete, organizando-o em “S” apertado, para não haver desaproveitamento de espaço.

Durante o transporte e mesmo quando já está nos armazéns dos distribuidores, salvo raras excepções, o vinho engarrafado não está imune às variações da temperatura ambiente. Estas variações de temperatura são responsáveis pela:

Variação no diâmetro do gargalo da garrafa pelos naturais efeitos de contracção ou dilatação do vidro;

Variações do volume do vinho. Como indicação, pode dizer-se que o vinho expande em média cerca de 0,2ml por cada grau centígrado (33,8F) de aumento de temperatura, aumentando a pressão interna em proporção directa.

Se bem que as variações do diâmetro do gargalo possam ser naturalmente compensadas pelas excelentes propriedades elásticas da cortiça, já o mesmo não se poderá dizer em relação à variação do volume do vinho e consequente variação da pressão interna. Para evitar este problema, devem ter-se em atenção as seguintes recomendações na altura do engarrafamento:

Engarrafar o vinho a uma temperatura ambiente entre 15º a 20ºC (59F a 68F) para conseguir um volume apropriado do vinho (Figura 5);

A máquina de engarrafar, com a correcta selecção do comprimento da rolha, deve ser calibrada para permitir um espaço de, pelo menos, cerca de 15mm entre a superfície do vinho e a rolha (valores para garrafas de 750ml). Este espaço livre é essencial para permitir a expansão do vinho no caso de um aumento de temperatura durante o transporte ou armazenagem (Figura 6);

Nos vinhos espumantes ou espumosos este espaçamento deve ser superior;

Para minorar os efeitos das alterações da pressão interna que poderiam levar à fuga de vinho, é aconselhável que o enchimento se faça sobre vácuo ou com a injecção de CO2. O CO2 é gradualmente absorvido pelo vinho, acabando por gerar uma pequena depressão no interior da garrafa. O engarrafamento sob vácuo ou com injecção de CO2 protegerá melhor o vinho contra oxidações prematuras e poderá ajudar na prevenção da multiplicação microbiana (Figura 7);

É necessário controlar frequentemente a pressão interna das garrafas acabadas de sair da linha de engarrafamento para confirmar se o sistema de vácuo ou injecção de CO2 está a funcionar correctamente. As pressões internas, no caso dos vinhos tranquilos, devem ser o mais próximas possíveis de zero (Figura 8);

Em condições limite, pressões internas elevadas dificultam uma perfeita adaptação da rolha ao gargalo depois do engarrafamento e tendem a forçar a saída de vinho para que a pressão interna se equilibre. Nestes casos, não existe uma saída contínua de vinho, mas apenas uma expulsão de alguns mililitros até ao restabelecimento da pressão interna. Não existe um problema na rolha, mas sim um problema na pressão interna da garrafa.

Outros cuidados que se deve ter na altura do engarrafamento:

1. Quanto ao local de engarrafamento, devemos ter em atenção que:

Esteja livre de insectos, especialmente “leptidopteros” (Borboleta de cave) (Figura 9);

Esteja correctamente ventilado, através de sistema de ventilação/exaustão forçada;

Esteja a uma temperatura ambiente constante entre os 15 e 20˚C (59F a 68F) (Figura 10).

2. As garrafas devem ser retiradas das paletes apenas na altura do engarrafamento. Antes do engarrafamento, as garrafas devem ser bem lavadas e muito bem secas (quase todas as máquinas de engarrafar fazem isto automaticamente).

3. As paletes com garrafas devem ser guardadas num armazém com temperaturas amenas e ambiente seco, sem bolores e sem madeiras tratadas por compostos clorados. As paletes devem ter pranchas para separar as garrafas de outro material que não sejam de cartão ou de compósitos de madeira.

4. Nunca passar as rolhas por água ou vinho antes do engarrafamento. No passado recorria-se a esta técnica para limpar as rolhas ou facilitar a sua introdução no gargalo, mas isto fazia com que estes líquidos se acumulassem nos poros da rolha, e desenvolvessem gostos e aromas que podiam lentamente migrar para o vinho. Actualmente as rolhas vêm já completamente preparadas para serem utilizadas, não necessitando de nenhum tratamento ou operação adicional. Se, por qualquer outro motivo for necessário limpar as rolhas, então, aconselha-se uma solução de sulfito libertando SO2.

5. O interior do gargalo da garrafa deve estar limpo e seco. Um gargalo húmido possui um fino filme líquido incompressível que irá dificultar a expansão da rolha, para além de diminuir a sua aderência ao vidro (Figura 11).

6. Nas garrafas normalizadas, o topo da rolha não deve ficar a mais de 1 mm abaixo do topo do gargalo. Idealmente, a rolha deve ficar a +/- 0,5mm do topo do gargalo. Se a rolha estiver muito para dentro estamos a provocar mais pressão interna (caso não haja engarrafamento por vácuo ou CO2) e a criar um espaço entre a rolha e a cápsula que não servirá senão para promover a formação de fungos. Se a rolha estiver muito para fora, teremos certamente problemas na altura da colocação da cápsula.

7. As rolhas com uma humidade inferior a 4% devem sofrer um processo de re-hidratação nas instalações do fornecedor e as rolhas com uma humidade superior a 9% devem sofrer um processo de secagem nas instalações do fornecedor e confirmação da qualidade sensorial que poderá estar comprometida em virtude de eventual desenvolvimento fúngico.

A manutenção do equipamento de engarrafamento é fundamental para obter das rolhas uma boa performance e, consequentemente, prolongar a vida de um vinho. Aqui estão alguns cuidados a ter com o equipamento:

Manter os canais de alimentação das rolhas muito bem limpos, assim como todos os mecanismos da máquina;

Assegurar o alinhamento do pistão e o estado de conservação e de alinhamento do cone de centralização. Isto é essencial para uma introdução correcta da rolha

no gargalo (Figura 12);

Verificar frequentemente o nível de desgaste das maxilas

de compressão, pois o mínimo desgaste ou defeito pode fazer sulcos laterais na rolha que poderão dar origem a fugas de vinho ou infiltrações de ar (Figura 13);

A máquina de engarrafar deve trabalhar com suavidade, especialmente durante a compressão da rolha, mas também com agilidade, sobretudo na altura da introdução da rolha no gargalo (Figura 14);

Manter limpas, com produtos isentos de cloro, todas as superfícies por onde passa a rolha de cortiça (Figura 15);

Antes de começar o engarrafamento, a máquina deve sofrer um processo de higienização. Aconselha-se a uma lavagem com jacto de uma solução de água a 80º C (176F) com metabissulfito e, em seguida, secar eventuais condensações de água.

O Repasse ou “Couleuse” é o defeito em que o vinho passa entre o gargalo e a rolha. Este problema pode ter várias causas, as quais podem ser evitadas cumprindo-se as regras já anteriormente enumeradas. De notar que, quase sempre, a ocorrência de tal problema resulta da combinação de diversos factores, o que nem sempre é fácil de identificar de uma forma sistemática e clara.

As causas para este problema são:

Pressão interna excessiva. Uma pressão interna excessiva não dá origem a uma fuga contínua de vinho, mas sim a uma perda temporária de alguns mililitros de vinho. Esta fuga acontecerá apenas até ao restabelecimento da pressão interna da garrafa;

Defeitos nas maxilas de compressão. Estes defeitos podem ser resultantes do desgaste das maxilas e terminam fazendo sulcos na superfície das rolhas;

Diâmetro da rolha inadequado, resultando numa força contra o gargalo insuficiente, comprometendo a estanquicidade;

“Verde”. É um problema que pode surgir em rolhas produzidas a partir de cortiça que não foi devidamente seca. Só quando o verde está presente numa rolha em grande quantidade é que pode dar origem a um repasse. Uma rolha com “verde” vai diminuindo o seu volume no interior do gargalo, muito provavelmente enrugando-se nas suas laterais, o que deixará passar o vinho. É um problema completamente aleatório e muito raro de aparecer nas rolhas terminadas, pois é minuciosamente controlado nas várias etapas de produção, desde a inspecção das pranchas ao controle visual das rolhas terminadas;

Canais – “Bicho”. Provocados por insectos quando a cortiça está na árvore. Este defeito é facilmente detectável depois da cortiça ter sido extraída e, como tal, extremamente raro de aparecer numa rolha terminada;

Defeitos de fabrico. São problemas que podem surgir durante o processo de produção, mas que são em geral facilmente detectáveis, dada a prática de um rigoroso controlo de qualidade durante as várias fases do processo de fabrico.

Devido às condições adversas que o vinho engarrafado sofre durante as longas viagens que tem que fazer para chegar ao seu destino, aconselha-se que as garrafas sejam sempre transportadas em posição vertical (Figura 16).

Recomenda-se usar contentores termicamente isolados ou escolher sempre as estações do ano mais frescas para se proceder ao transporte dos vinhos, especialmente para os vinhos que têm que ser transportados entre continentes.

Se o vinho vai ser transportado em contentores marítimos, dever-se-á saber qual foi o tipo de carga que esse mesmo contentor transportou no seu último serviço. No caso de o contentor não se encontrar limpo, livre de odores e completamente seco, deverá ser rejeitado. Se tal não for possível, dever-se-á proceder à sua limpeza com, por exemplo, um jacto de uma solução de metabissulfito, não esquecendo de o secar convenientemente.

A humidade resultante de fenómenos de condensação durante o transporte promove o aparecimento de fungos que podem gerar um posterior aparecimento de cloroanisóis ou outros compostos responsáveis por odores não desejados.

A expressão “a adega faz o vinho” é tão antiga como inteiramente verdadeira. A temperatura, humidade e higiene de uma adega concorrem para a qualidade final do vinho. A adega deve possuir as seguintes características:

Temperatura ambiente entre os 15º C (59F) e os 20º C (68F), sem grandes amplitudes térmicas, quer durante o dia, quer durante o ano;

Humidade entre os 50% e os 70%;

A adega deve estar livre de insectos e roedores. Não se incluem aqui as aranhas, pois são um excelente predador de insectos indesejáveis;

As adegas não devem ter madeiras tratadas com químicos;

As adegas devem estar isentas de odores;

Não se devem guardar numa adega produtos químicos, como tintas ou produtos de limpeza;

As garrafas podem ser mantidas em posição horizontal para que o vinho esteja em contacto com a rolha e esta mantenha as suas excelentes propriedades elásticas.

in “Manual Técnico de Rolhas PT 2015 – APCOR”

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